Introdução
Na indústria de óleo e gás, os reservatórios de petróleo podem ser classificados em duas categorias principais: convencionais e não convencionais. Os reservatórios de petróleo não convencional apresentam características geológicas específicas, como baixa permeabilidade e rápida queda de pressão, o que exige estímulos para a produção de hidrocarbonetos, e têm uma recuperação de óleo significativamente menor em comparação com reservatórios convencionais.
O desenvolvimento da indústria de óleo e gás tem sido marcado pela crescente exploração de reservatórios não convencionais, motivada pela necessidade de satisfazer a demanda energética global. À medida que os recursos de petróleo convencional se tornam progressivamente mais escassos ou economicamente inviáveis, a atenção se volta para fontes como shale oil e tight oil, e, no caso do Brasil, o pré-sal. Esses recursos apresentam desafios tecnológicos e operacionais específicos, derivados das características das formações geológicas, como baixa permeabilidade, alta heterogeneidade e a presença de contaminantes que impactam diretamente a eficiência dos processos de produção e refino.
A produção em reservatórios de cru não convencional requer o uso de técnicas avançadas de perfuração, completação e estimulação, como a fraturação hidráulica e a perfuração horizontal, para viabilizar economicamente a extração de hidrocarbonetos. Além disso, o refino dessas correntes impõe requisitos adicionais aos sistemas catalíticos de unidades de craqueamento fluidizado (UFCC), o que demanda o desenvolvimento de catalisadores mais robustos e estratégias operacionais capazes de mitigar os efeitos adversos causados por contaminantes como ferro, cálcio, cobre, sódio, potássio, entre outros, bem como por outras características inerentes às cargas (como maior acidez, teor de oxigênio e presença de sais).
1. Shale oil
O shale oil é considerado o petróleo não convencional mais valioso e com maior potencial de desenvolvimento. A produção de shale oil nos Estados Unidos provocou uma revolução no panorama energético global, aumentando rapidamente a produção de petróleo no país. Na China, as reservas geológicas de shale oil são de cerca de 30 bilhões de barris, com grande potencial de desenvolvimento. Outro país que se destaca por possuir grandes reservas de shale oil é a Argentina, na região conhecida como Vaca Muerta. Em 2013, a U.S. Energy Information Administration (EIA) estimou que o volume de óleo recuperável em Vaca Muerta seria da ordem de 16,2 bilhões de barris, posicionando a Argentina como o quarto país com a maior reserva de óleo não convencional do mundo.
Figura 1 – Reservas globais de shale oil.

Fonte – Adaptado de EIA, 2025.
O shale oil é composto por óleo preservado em xisto rico em matéria orgânica e apresenta maturidade orgânica média a alta. O xisto atua tanto como rocha-mãe quanto como rocha-reservatório e, portanto, pode ser denominado de “óleo de rocha geradora”. O óleo de xisto existe nos estados adsorvido e livre, e geralmente possui baixa densidade e viscosidade. Ele se armazena principalmente em poros e fraturas em nanoescala e se encontra distribuído ao longo de estratos lamelares ou microfraturas paralelas. A Tabela 1 apresenta algumas características dos principais pontos de exploração de shale oil no mundo.
Tabela 1 – Propriedades de alguns importantes pontos de exploração de shale oil no mundo.

*COT – carbono orgânico total (%); Ro – expressa a maturidade térmica da matéria orgânica (%)
Fonte – Adaptado de WANG et al., 2019.
2. Tight oil
O tight oil é o óleo convencional que se encontra em reservatórios de baixa permeabilidade (menor que 0,1 mD) e baixa porosidade (menor que 10%) e necessita de técnicas de perfuração e completação de poços tecnologicamente avançadas. O processo de extração resulta em hidrocarbonetos líquidos obtidos por meio do fraturamento hidráulico de formações de xisto, permanecendo uma fração pesada, semelhante ao alcatrão, no depósito de xisto.
As maiores reservas tecnicamente recuperáveis de tight oil encontram-se na Rússia (75 bilhões de barris) e nos Estados Unidos (58 bilhões de barris), destacando-se também a China, Argentina, Líbia, Venezuela e México, que em conjunto somam 30 bilhões de barris, segundo dados da EIA.
Em geral, a composição do tight oil é diferente dos petróleos tradicionais, apresentando:
- maior densidade API;
- maior rendimento de diesel e frações leves;
- maior contaminação por Fe, Ca, Na e Pb;
- menor teor de enxofre;
- maior teor de componentes parafínicos.
Devido à diferença de rendimentos em comparação com os petróleos tradicionais, como mostra a Figura 2, pode ser necessária a mistura com outros crus para ajustar os rendimentos ou a adaptação do hardware em unidades antigas.
Figura 2 – Comparação entre tight oil e outros óleos não convencionais.

Fonte – Adaptado de LELIVELD e TOSHIMA, 2015.
3. Pré-sal
O petróleo do pré-sal foi descoberto em 2007 no Brasil e está localizado nas rochas sedimentares que existem abaixo de uma espessa camada de sal, de até 2.000 metros, que impede a migração do óleo. A produção diária de petróleo no pré-sal é elevada, tendo passado de uma média de 41 mil barris por dia em 2010 para um nível de 1,9 milhão de barris por dia em 2020, com possibilidade de alcançar 5 milhões de barris por dia em 2030, o que mostra a alta produtividade dos poços do pré-sal, representado pela Figura 3.
Figura 3 – Produtividade de poços de petróleo em diversas regiões do mundo.

Fonte – SANDREA e GODDARD, 2016.
De acordo com a Agência Nacional do Petróleo (ANP), o petróleo do pré-sal é classificado como cru leve, já que apresenta maior densidade API, comparada à outros tipos de óleo. Além disso, o óleo extraído contém menor teor de enxofre e maior teor de sais à base de sódio, cálcio e potássio. Os sais contidos no petróleo constituem uma fonte de corrosão para os equipamentos da refinaria. A Tabela 2 apresenta uma comparação da qualidade dos poços de petróleo do pré-sal e do pós-sal.
Tabela 2 – Comparação entre petróleos brasileiros do pré-sal e do pós-sal.

* Poços de petróleo do pré-sal.
Fonte – Adaptado de DELGADO e GAUTO, 2021.
4. Desafios para o refino
Cada unidade de cada refinaria é projetada de acordo com uma qualidade média esperada da carga e com uma margem que permite certa flexibilidade operacional dentro de um intervalo determinado. A unidade de destilação é a mais dependente da qualidade do petróleo, enquanto as demais unidades, em geral, são afetadas pela vazão e pela qualidade dos produtos da destilação.
No processamento de cargas de petróleos não convencionais, podem ocorrer depósitos de parafinas nas linhas, aumentando a perda de carga nos sistemas e podendo representar um problema especialmente grave para os oleodutos que abastecem as refinarias.
Devido às características específicas como a presença de sólidos em suspensão e o alto ponto de fluidez, o processamento de cargas mais leves pode levar à necessidade de investimentos em melhorias no aquecimento de tanques e tubulações, bem como ajustes nos filtros de bombas.
De maneira geral, utilizam-se duas estratégias:
- Misturar petróleos para adequar os rendimentos e a qualidade de produtos de acordo com o hardware da refinaria.
- Realizar modificações nas unidades de processo para manejar a nova carga e o perfil de rendimentos.
A mistura desses petróleos com crus convencionais, com maiores teores de hidrocarbonetos pesados, pode agravar alguns problemas já bastante conhecidos. No contexto de ajuste de rendimentos e qualidade de produtos, a mistura de crus leves com crus mais pesados faz todo sentido e é uma estratégia muito utilizada.
No entanto, mesmo quando se deseja a segregação inicial desses crus mais leves, como em bases intermediárias e tanques de recepção, o contexto do sistema de armazenamento pode levar a uma mistura não intencional devido à existência de lastros nos tanques. Essa mistura – de petróleos leves e parafínicos com petróleos mais ricos em componentes pesados, intencional ou não – pode provocar o fenômeno de deposição de asfaltenos. Quando isso ocorre, diz-se que os petróleos são incompatíveis. Nesse contexto, análises laboratoriais realizadas previamente à recepção dos carregamentos podem ajudar a prever e mitigar esse problema, assim como o uso de softwares especializados.
Para o processamento de cargas de petróleos mais leves, os principais desafios e as soluções adotadas estão descritos a seguir:

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